“Por que choras MEC?”: entrevista com a Gifs Educativos

Amanda Fonseca
6 min readDec 1, 2020

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Humor, gifs e educação: a geração Z parece estar em busca de alternativas para o conhecimento.

Além de meme, Gretchen também virou escala de notas em uma escola de BH.

Já falei um pouco sobre a geração Z e as novas características e caminhos da educação e do marketing para um grupo totalmente conectado. Agora vou mostrar que um dos hábitos mais perceptíveis dos brasileiros na internet, a zueira, também garante seu espaço quando o assunto é conhecimento. Para falar mais sobre o tema, conversei com dois moderadores da página Gifs Educativos, Henrique Costa e Maria Coelho de Freitas e com o criador, Junior Akira.

Pode ser que você ainda não tenha sido apresentado a essa página — é compreensível com a quantidade de informação que surge na internet todos os dias, mas também não há motivos para se sentir mal, afinal, faz pouco tempo que a página começou a ganhar repercussão. E também vai ser aceitável se depois de conhecer, você fique um pouco “viciado” (assim como quem vos escreve).

A ideia de unir gifs e conhecimentos gerais já existia e o Junior via muitos deles circulando pelo Twitter. No entanto, como é uma rede social muito dinâmica, o conteúdo se perdia por lá. Até que no começo de 2019, o estudante de arquitetura de 22 anos e morador de Itapeva, no interior de São Paulo, resolveu criar uma espécie de acervo para armazenar e alimentar um certo público. Surgiu a página Gifs Educativos.

E foi assim que Henrique, estudante de 21 anos de um curso pré-vestibular na cidade de Divinópolis (MG) e Maria, mineira de 16 anos radicada nos Estados Unidos e estudante do Ensino Médio conheceram a comunidade de criadores da Gifs Educativos.

Henrique: Deve ter quase dois meses mais ou menos [que entrei para a comunidade de criadores]. Eu já curtia a página e achei muito interessante. Eu pensei: ‘eu acho que posso colaborar com eles também’. Primeiro que eu gosto muito de memes, segundo que eu também sou muito curioso. Adoro aprender coisas novas. Na verdade, acho que todo mundo gosta, às vezes falta um incentivo. Mas acho que isso é a essência de todo mundo.

Maria: Acho que foi em junho, acho que foi quando a página começou a se popularizar mais. Eles divulgaram o grupo na página do Facebook, daí eu entrei. O grupo tava bem no começo, tinha umas 100 pessoas. O Junior tinha feito um post pra se juntar à moderação. E tô aqui até hoje, faz 4 meses já.

Hoje os Gifs Educativos estão nas principais redes sociais (Facebook, Twitter e Instagram). O grupo no Facebook tem mais de 3 mil membros, a página mais de 26 mil fãs, mas parece que o sucesso maior vem do Instagram, com mais de 76 mil seguidores.

Se a ideia já existia, a pergunta é: por que eles acreditam nela? Qual a explicação para dar certo?

Gretchen onipresente e onipotente

Henrique: A gente andou conversando com o Junior sobre isso [a origem da página]. Ele viu que era uma forma inovadora de estar repassando conhecimento. Uma forma inclusive mais fácil de aprender, porque você vê cenas do cotidiano, cenas de programas que muitas vezes a gente ouve falar ‘ah, tem um nível cultural muito baixo’, mas é uma coisa que causou repercussão. Então você pegar isso e misturar com o aprendizado, com o ensino, dá muito certo. Por mais que as pessoas falem que tem um nível cultural muito baixo, que é fútil, a gente gosta, é um lazer. Muitos gifs que a gente produz é utilizando reality shows como a Fazenda. É o que? É Gretchen, é Andressa Urach, é Denise, é Bárbara. Querendo ou não, são personagens que o público LGBTQ+ sempre tá dando evidência, por causa da personalidade, do expressionismo que esse pessoal tem. Acaba que dá certo por causa disso, é algo divertido, tem uma pegada social por trás, porque como te falei, quem conhece mais é esse público, então sabem o contexto.

Maria: Como o Henrique tava falando, o público LGBTQ+ foi o público base que suportou a página, porque o primeiro reconhecimento que a gente recebeu foi do PapelPop e a [youtuber] Maíra Medeiros contou pra Gretchen da nossa página. Inclusive, uma das primeiras pessoas famosas que seguiu a página foi a Gretchen. E é exatamente isso que a gente tava falando dela ser uma personagem protagonistas nos gifs. E desde então tem sido um suporte enorme.

Tem cara, cor e jeito de Geração Z

O perfil traçado dos Z’s destaca aspectos como inclusão, diversidade, diálogo, humor e leveza. E dá para perceber a preocupação dos moderadores com certos valores.

Henrique: A gente já teve problema.

Maria: Por causa de como algumas coisas são abordadas. Às vezes no grupo mesmo as pessoas são desrespeitosas, é algo que a gente tem que ter controle. Há pouco tempo tinha um participante que era ativo no grupo e alguém tinha feito um gif com linguagem neutra**. E ele veio nos comentários, falando que gênero só existem dois, masculino e feminino, “quem não aceitar, que se vire”. E foi algo que impactou bastante, porque a página tem um grande público LGBTQ+, é uma plataforma muito grande. A gente teve que começar a criar regras sobre respeito à diversidade. Ele acabou sendo banido do grupo. Tem histórias engraçadas, mas às vezes as pessoas passam do limite, precisa ter esse controle.

Fato ou Fake?

É 2019 e todo dia nós precisamos lidar com informações falsas sendo compartilhadas, até mesmo por representantes do governo. Quer dado mais preocupante que grupos antivacinação espalhando notícias falsas enquanto ocorre um surto de sarampo pelo país? Lidar com informação é responsabilidade, mas os gif makers estão ligados nisso?

Maria: A gente checa na internet, olha se foi realmente aquilo que aconteceu. Um tempo atrás, alguém fez um gif sobre a 2ª Guerra Mundial, mas estava meio historicamente incorreto e aí juntou uma galera para pesquisar e ver se era aquilo mesmo. A página sempre tenta fazer mais gifs de conhecimento geral, porque é tipo algo mais fácil, mais fácil de entender. Para gifs mais específicos, tem essa pesquisa. Eu mesma quando vou fazer algo que não é tão geral, sempre dou uma pesquisada antes.

Henrique: Existem sim alguns professores no grupo. E é no grupo mesmo que é feita essa checagem. Não precisa ser professor, às vezes estudantes falam “olha, não é isso, é aquilo” e já é editado ali. Normalmente, quem sabe, já chega direto e fala. Sem contar que também tem a parte que não pode desrespeitar os direitos humanos, né?! A gente não deixa nenhuma publicação politicamente incorreta ir pra página. Inclusive nós mesmos, moderadores, que somos quem cria a maioria dos gifs, a gente conversa no grupo do WhatsApp. E a gente tem que tomar cuidado, senão a página cai, porque pode sofrer alguma denúncia e não é a intenção. Isso na internet é muito grave. Às vezes um mal-entendido toma um tamanho, então a gente frisa muito essa checagem. Se aquilo tá desrespeitando alguém e se tá certo, né?! Tipo assim, a fonte não é “vozes da minha cabeça”.

Tudo online, por diversão e pelo compartilhamento

Atualmente, quatro pessoas são responsáveis pela Gifs Educativos — cada um em um canto do mundo e não se conhecem pessoalmente. No entanto, definem a própria relação como uma webamizade, alimentada todo dia pelo grupo do WhatsApp.

É fácil enxergar que eles criam todo esse conteúdo, primeiramente, pela diversão, mas também não deixam de se orgulhar com o resultado e o reconhecimento.

Henrique: A gente sabe que na escola, às vezes, as pessoas não têm nem maturidade pra tá ali. E quando você aborda o ensino de uma forma mais descontraída chama mais a atenção.

Maria: Você pode ver um gif, se interessar e pesquisar. Uma das coisas que mais me deixou orgulhosa foi uma vez que fiz um gif sobre a criação do brigadeiro. E ficou um monte de gente no comentário falando: “ah, eu não sabia dessa história, agora vou pesquisar”. Então eu acho que é algo que impulsiona a educação e a curiosidade das pessoas.

* *Muitas vezes termos no plural, como por exemplo o pronome pessoal na terceira pessoa (eles) é usado para definir um grupo não heterogêneo, composto também por mulheres e pessoas não binárias, que não se identificam por nenhum destes dois gêneros. No entanto, também na linguagem, o gênero masculino é dominante em muitas situações. Assim, uma alternativa é substituir os indicativos de gênero pela letra “x” ou pelo símbolo “@”. (Ex: elxs, tod@s). Esta linguagem não é consensual, porque no caso da internet, dificulta o entendimento de pessoas com deficiência visual que utilizam programas de leitura de tela.

Este texto foi publicado originalmente pela Agência Cative! e faz parte de uma colaboração minha com este time de mulheres especialistas em comunicar o propósito de marcas visionárias e humanizadas.

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Amanda Fonseca

jornalista, feminista, impulsiva, sincerona. Meu medo é não poder mudar de roupa, de cabelo, de lugar e de opinião.